Introduzido em nosso direito através da Lei 9.430, de 1996, as regras pertinentes aos efeitos tributários das operações de comércio internacional entre pessoas jurídicas coligadas, tem causado até hoje uma série de críticas e dúvidas sobre sua adequada aplicação. Em especial a aplicação da regra do PRL, revogado pela MP 472, de 2009, e pelo advento da MP 476, do mesmo ano. A alteração legislativa criou dificuldade no entendimento da adequada regra aplicável para os anos de 2009 e 2010.
A Receita Federal através do Parecer Normativo nº1, publicado no Diário Oficial de 08.05.2012, extrava a opinião da autoridade tributária a respeito de alguns aspectos desta matéria.
PARECER NORMATIVO Secretaria da Receita Federal do Brasil (SRFB)
nº 1 de 20.01.2012. DOU 08.05.2012
O método PRL com margem de lucro de 20% e com margem de lucro de 60% previsto na alínea "d" do inciso II do art. 18 da Lei nº 9.430, de 1996, pode ser aplicado nos anos-calendário de 2009 e 2010;
Para o período de 1º de janeiro de 2010 a 31 de maio de
2010, pode ser aplicado o método PVL com margem de lucro de 35%, previsto na MP
nº 478, de 2009, na hipótese em que seja mais favorável ao contribuinte.
Relatório
Trata-se de análise dos efeitos legais das Medidas Provisórias
nº 472, de 15 de dezembro de 2009, nº 476, de 23 de dezembro de 2009 e nº 478,
de 29 de dezembro de 2009, com relação às alterações da legislação de preços de
transferência.
2. A legislação brasileira de preços de transferência visa a
coibir a transferência dissimulada de resultados mediante o superfaturamento de
importações e o subfaturamento de exportações e, para tal, estabelece margens
de lucro, em transações de importação ou de exportação de bens, serviços ou
direitos, bem como operações de mútuo realizadas entre pessoas sediadas e
domiciliadas no Brasil e pessoas vinculadas e domiciliadas no exterior.
3. As regras de preços de transferência se aplicam também a
operações entre pessoa física ou jurídica residente no Brasil e qualquer
pessoa, vinculada ou não, residente em jurisdição de tributação favorecida ou
beneficiada por regime fiscal privilegiado.
4. Dessa forma, nas operações de importação, os valores
referentes a custos despesas e encargos, constantes de documentos de
importação, são dedutíveis até o valor que não exceda o preço parâmetro
calculado pelos métodos previstos originalmente na Lei nº 9.430, 27 de dezembro
de 1996.
5. No que diz respeito ao exame da matéria, destaca-se o art.
2º da Lei nº 9.959, de 2000, que inseriu o inciso II ao art. 18 da Lei nº
9.430, de 1996, de forma a se admitir a aplicação de diferentes margens de
lucros pré-estabelecidas, para fins de cálculo do método PRL, em duas
hipóteses: no caso de uso de bens importados na produção de outro bem e no caso
de exclusiva revenda de bens importados em território brasileiro. Reproduz-se
sua redação original:
"Art. 2º. A alínea "d" do inciso II do art.
18 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, passa a vigorar com a seguinte
redação:
"Art. 18 (...)
II - Método do Preço de Revenda menos Lucro - PRL: definido
como a média aritmética dos preços de revenda dos bens ou direitos, diminuídos:
a) dos descontos incondicionais concedidos;
b) dos impostos e contribuições incidentes sobre as vendas;
c) das comissões e corretagens pagas;
d) da margem de lucro de:
1. sessenta por cento, calculada sobre o preço de revenda
após deduzidos os valores referidos nas alíneas anteriores e do valor agregado no
País, na hipótese de bens importados aplicados à produção;
2. vinte por cento, calculada sobre o preço de revenda, nas
demais hipóteses. .
(...)"
6. A Medida Provisória nº 472, de 2009, previu, em seu art.
61, inciso II, a revogação do art. 2º da Lei nº 9.959, de 2000, da seguinte
forma:
" Artigo. 61. Ficam revogados:
(...)
II - O art. 2º da Lei nº 9.959, de 27 de janeiro de 2000:
(...)"
7. Em seguida, foi editada a MP nº 476, de 2009, que, em seu
art. 6º, eliminou a revogação estabelecida pelo art. 61, inciso II, da MP nº
472, de 2009, e definiu expressamente o retorno da vigência do art. 2º da Lei
nº 9.959, de 2000:
"Artigo. 6º Fica revogado o inciso II do art. 61 da
Medida Provisória nº 472, de 15 de dezembro de 2009, voltando a viger o art. 2º
da Lei nº 9.959, de 27 de janeiro de 2000."
8. A MP nº 478, de 2009, reafirmou, em seu o art. 11, o
intuito do Poder Executivo, de eliminar a revogação prevista pelo art. 61,
inciso II, da MP nº 472, de 2009, ao estabelecer, expressamente, seu efeito
repristinatório, deixando clara a possibilidade de aplicação do Método PRL, no
exercício de 2009:
Artigo. 11. Para os fatos geradores ocorridos em 2009, o
contribuinte que optar pelo método do preço de revenda menos lucro (PRL) deverá
observar o disposto no inciso II do art. 18 da Lei nº 9.430, de 1996, com as
alterações dadas pela Lei nº 9.959, de 27 de janeiro de 2000.
9. A seguir, são apresentadas as principais linhas de
entendimento da Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB) sobre os efeitos
legais das referidas MPs, tendo em vista a identificação de controvérsias sobre
o assunto.
Fundamentos
10. São relevantes as disposições constitucionais referentes
ao Princípio da Anterioridade (art. 150, inciso III, alínea b) e à edição de medidas
provisórias (art. 62, §§ 2º, 3º, 7º, 11 e 12 da Constituição Federal):
a) art.
150, inciso III, alínea b:
"Art.
150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é
vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
III - cobrar tributos:
b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada
a lei que os instituiu ou aumentou;
(...)"
b) art 62, §§ 2º, 3º, 7º, 11 e 12 da Constituição Federal de
1988:
"Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o
Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei,
devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional.
§ 1º (...)
§ 2º Medida provisória que implique instituição ou majoração
de impostos, exceto os previstos nos arts. 153, I, II, IV, V, e 154, II, só
produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte se houver sido convertida em
lei até o último dia daquele em que foi editada.
§ 3º As medidas provisórias, ressalvado o disposto nos §§ 11
e 12 perderão eficácia, desde a edição, se não forem convertidas em lei no
prazo de sessenta dias, prorrogável, nos termos do § 7º, uma vez por igual
período, devendo o Congresso Nacional disciplinar, por decreto legislativo, as
relações jurídicas delas decorrentes.
§ 7º Prorrogar-se-á uma única vez por igual período a
vigência de medida provisória que, no prazo de sessenta dias, contado de sua
publicação, não tiver a sua votação encerrada nas duas Casas do Congresso
Nacional.
§ 11. Não editado o decreto legislativo a que se refere o §
3º até sessenta dias após a rejeição ou perda de eficácia de medida provisória,
as relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos praticados durante sua
vigência conservar-se-ão por ela regidas.
§ 12. Aprovado projeto de lei de conversão alterando o texto
original da medida provisória, esta manter-se-á integralmente em vigor até que
seja sancionado ou vetado o projeto.
Sobre os efeitos das Medidas Provisórias nº 472, nº 476, e
nº 478, relativamente a fatos geradores ocorridos em 2009.
11. A MP nº 472, de 2009, resultou na eliminação das margens
de lucro utilizadas no cálculo de apuração do preço parâmetro pelo Método PRL e
teve como conseqüência, a impossibilidade de sua aplicação, sem que qualquer de
seus dispositivos tivesse previsto a substituição do Método PRL por um novo
método de cálculo - o que só ocorreu mediante a edição da MP nº 478, de 2009.
12. Por decorrência, foram identificadas diferentes
interpretações sobre os efeitos legais gerados por aquela MP. Segundo uma
interpretação superficial, a redação do art. 61, inciso II, da MP nº 472, de
2009, teria revogado apenas as margens de 20% e de 60%, aplicáveis ao método
PRL, o que permitiria ao contribuinte calcular o preço parâmetro com base,
exclusivamente, no valor de revenda sem dedução de qualquer margem. Tal
entendimento não é correto uma vez que a aplicação de margens de lucro pré-estabelecidas
é inerente ao cálculo do método PRL.
13. As margens de 20% e de 60% são imprescindíveis, para
fins de cálculo dos preços parâmetros. Caso tais margens não fossem utilizadas,
os preços de revenda dos bens, serviços e direitos da própria empresa no
mercado interno seriam considerados custos dedutíveis da base de cálculo do
imposto de renda, o que contraria a lógica do Método PRL.
14. A edição da Medida Provisória nº 472, de 2009, reduziu
as alternativas de métodos passíveis de utilização pelo contribuinte,
contrariando a lógica da legislação brasileira de preços de transferência, que
assegura ao contribuinte a escolha do método mais favorável. A esse respeito,
cabe ressaltar o disposto no art. 4º, § 2º, da IN nº 243, de 11 de novembro de
2002:
"Artigo. 4º Para efeito de apuração do preço a ser
utilizado como parâmetro, nas importações de empresa vinculada, não-residente,
de bens, serviços ou direitos, a pessoa jurídica importadora poderá optar por
qualquer dos métodos de que tratam os arts. 8º a 13, exceto na hipótese do §
1º, independentemente de prévia comunicação à Secretaria da Receita Federal.
(...)
§ 2º Na hipótese de utilização de mais de um método, será
considerado dedutível o maior valor apurado, devendo o método adotado pela
empresa ser aplicado, consistentemente, por bem, serviço ou direito, durante
todo o período de apuração."
15. Outra interpretação dos efeitos legais da MP nº 472, de
2009, baseou-se no fato de que, ao reduzir as possibilidades de opção de
métodos, a revogação prevista pelo art. 61, inciso II, da MP nº 472, de 2009,
poderia resultar na majoração indireta de imposto de renda e da Contribuição
Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Cabe observar, no entanto, que, segundo o art.
62, § 2º, da Constituição Federal, medidas provisórias que instituam ou
aumentem impostos só produzem efeitos no exercício seguinte se tiverem sido
convertidas em lei até o último dia daquele em que forem editadas - o que não
ocorreu, uma vez que a MP nº 472 não foi convertida em Lei nº exercício de
2009.
16. Sustentou-se, ainda, que a MP nº 476, de 2009, teria
criado um novo Método PRL, tendo em vista o lapso de tempo (de oito dias) entre
a edição da MP nº 472, de 2009, e a MP nº 476, de 2009. Segundo esse
entendimento, a edição da MP nº 476, de 2009, levaria a um potencial aumento do
imposto de renda e da CSLL para fatos geradores ocorridos naquele período do
exercício de 2009. A MP nº 476, de 2009, não deve ser interpretada como forma
de elevar a carga tributária, vedada pelo Princípio da Anterioridade. A MP nº
476, de 2009, deve ser considerada como medida de retorno ao status quo ante à MP
nº 472, de 2009, para, consequentemente, restabelecer a garantia de escolha do
método de cálculo de preços parâmetros potencialmente mais favorável ao
contribuinte, incluindo-se a possibilidade de aplicação do Método PRL20 ou
PRL60.
17. É importante observar que a MP nº 478, de 2009, deixa
claro o objetivo do legislador de restringir a aplicação do Método PRL ao
exercício de 2009. Nota-se que da combinação do art. 9º com o art. 15 da MP nº
478, de 2009, resulta a previsão de criação de um novo método de cálculo - o
Método Preço de Venda menos Lucro (PVL) -, em substituição ao Método PRL, com
produção de efeitos, apenas a partir de 2010. Transcrevem-se, a seguir, os arts.
9º e 15, da MP nº 478, de 2009:
" Art. 9º O art. 18 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro
de 1996, passa a vigorar com a seguinte redação:
"Art. 18. Os custos, despesas e encargos relativos a
bens, serviços e direitos, constantes dos documentos de importação ou de
aquisição, nas operações efetuadas com pessoa vinculada, somente serão
dedutíveis na determinação do lucro real até o valor que não exceda ao preço
determinado, observadas as condições previstas no presente dispositivo, por um
dos seguintes métodos:
I - Método dos Preços Independentes Comparados- PIC:
definido como a média aritmética ponderada dos preços de
bens, serviços ou direitos, idênticos ou similares, apurados no mercado
brasileiro ou de outros países, em operações de compra e venda, empreendidas
pela própria interessada ou por terceiros com não vinculadas, em condições de
pagamento semelhantes;
II - Método do Custo de Produção mais Lucro- CPL: definido
como o custo médio ponderado de produção de bens, serviços ou direitos,
idênticos ou similares, no país onde tiverem sido originariamente produzidos,
acrescido dos impostos e taxas cobrados pelo referido país na exportação e de
margem de lucro de vinte por cento, calculada sobre o custo apurado;
III - Método do Preço de Venda menos Lucro - PVL: definido
como a média aritmética ponderada dos preços de venda no País dos bens,
direitos ou serviços importados e calculado conforme a metodologia a seguir:
a) preço líquido de venda: a média aritmética ponderada dos
preços de venda do bem, direito ou serviço produzido, diminuídos dos descontos
incondicionais concedidos, dos impostos e contribuições sobre as vendas e das
comissões e corretagens pagas;
b) percentual de participação dos bens, direitos ou serviços
importados no custo total do bem, direito ou serviço vendido: a relação
percentual entre o custo médio ponderado do bem, direito ou serviço importado e
o custo total médio ponderado do bem, direito ou serviço vendido, calculado em
conformidade com a planilha de custos da empresa;
c) participação dos bens, direitos ou serviços importados no
preço de venda do bem, direito ou serviço vendido: aplicação do percentual de
participação do bem, direito ou serviço importado no custo total, apurada
conforme a alínea "b", sobre o preço líquido de venda calculado de
acordo com a alínea "a";
d) margem de lucro: a aplicação do percentual de trinta e
cinco por cento sobre a participação do bem, direito ou serviço importado no
preço de venda do bem, direito ou serviço vendido, calculado de acordo com a
alínea "c";
e) preço parâmetro: a diferença entre o valor da
participação do bem, direito ou serviço importado no preço de venda do bem,
direito ou serviço vendido, calculado conforme a alínea "c", e a
"margem de lucro", calculada de acordo com a alínea "d".
§ 1º As médias aritméticas ponderadas dos preços de que
tratam os incisos I e III e o custo médio ponderado de produção de que trata o
inciso II serão calculados considerando os preços praticados e os custos
incorridos durante todo o período de apuração da base de cálculo do imposto de
renda a que se referirem os custos, despesas ou encargos.
§ 2º O cálculo do preço parâmetro, conceituado na forma da
alínea "e" do inciso III, pelo método a que se refere o inciso I,
ambos do caput, quando efetuado pelo contribuinte, deverá atender,
cumulativamente, aos seguintes requisitos:
I - estar embasado por operações de compra e venda
praticadas, exclusivamente, por compradores e vendedores não vinculados;
II - que as operações utilizadas para fins de cálculo
representem, ao menos, dez por cento do valor das operações de importação
sujeitas ao controle de preços de transferência, empreendidas pelo
contribuinte, no período de apuração, quanto ao tipo de bem, direito ou serviço
importado, na hipótese em que os dados utilizados para fins de cálculo digam
respeito às suas próprias operações.
§ 3º Para efeito do disposto no inciso III, somente serão
considerados, para fins de cálculo do preço parâmetro, os preços de venda
obtidos pela pessoa jurídica importadora do bem, direito ou serviço,
exclusivamente, em operações com não vinculadas, empreendidas no período de
apuração.
§ 4º Na hipótese de utilização de mais de um método, pelo
contribuinte, precedentemente ao início do procedimento fiscal, será
considerado dedutível o maior valor apurado, observado o disposto no § 5º.
§ 5º Se os valores apurados segundo os métodos mencionados
neste artigo forem superiores aos de aquisição, constante dos respectivos
documentos, a dedutibilidade, para fins de determinação do lucro real, fica
limitada ao montante deste último.
§ 6º Integram o custo de aquisição, para efeito de cálculo
do preço médio ponderado a que se refere o inciso III do caput, o valor do
transporte e do seguro até o estabelecimento do contribuinte, cujo ônus tenha
sido do importador, e os impostos não recuperáveis incidentes nessas operações
e demais gastos com o desembaraço aduaneiro.
§ 7º A parcela dos custos que exceder ao valor determinado
em conformidade com este artigo deverá ser adicionada ao lucro líquido, para
determinação do lucro real.
§ 8º A dedutibilidade dos encargos de depreciação ou
amortização dos bens e direitos fica limitada, em cada período de apuração, ao
montante calculado com base no preço determinado na forma deste artigo.
§ 9º O disposto neste artigo não se aplica aos casos de
royalties e assistência técnica, científica, administrativa ou assemelhada, os
quais permanecem subordinados às condições de dedutibilidade constantes da
legislação vigente.
§ 10. Para efeito do disposto no inciso III, na hipótese de
um mesmo bem importado ser revendido e aplicado na produção de um ou mais
produtos, ou na hipótese de o bem importado ser submetido a diferentes
processos produtivos, o preço parâmetro final será a média ponderada dos
valores encontrados mediante a aplicação do método PVL, de acordo com suas respectivas
destinações. (NR)
(...)
Art. 15. Esta Medida Provisória entra em vigor na data de
sua publicação, produzindo efeitos a partir de 1º de janeiro de 2010 em relação
ao disposto nos arts. 9º e 10."
18. Não deve prevalecer, portanto, o entendimento segundo o
qual, com a repristinação, haveria nova lei em que se prevê "novo Método
PRL". Nesse caso, cabe citar os comentários de Maria Helena Diniz sobre a
aplicação do "princípio da retroatividade", segundo o qual "é
retroativa a norma que atinge os atos jurídicos praticados sob império da norma
revogada. E irretroativa a que não se aplica a qualquer situação jurídica
constituída anteriormente.(...) O ato jurídico perfeito é aquele que já se
consumou segundo a norma vigente ao tempo em que se efetuou ...".(1
Conforme Maria Helena Diniz em Direito Civil Brasileiro, vol 1, 22ª edição,
págs. 99 e 100)
19. Convém sublinhar que, no que diz respeito ao seu efeito
repristinatório, as Medidas Provisórias nº 476, de 2009, e nº 478, de 2009 estão
de acordo com as disposições do art. 2º, §3º, da Lei de Introdução ao Código
Civil, conforme sua redação a seguir reproduzida:
"a lei revogadora não tem efeito repristinatório sobre
a velha lei abolida, senão quando houver pronunciamento expresso do legislador
a esse respeito."
20. Frise-se que, da leitura de tais regras, tanto na
redação da MP nº 476, de 2009, quanto nas disposições da MP nº 478, de 2009, o
legislador pretendeu manter o direito de opção pelo método PRL, para o
exercício de 2009, conforme dispunha o art. 2º da Lei nº 9.959, de 2000. Não
cabe, portanto, o entendimento de que a MP nº 476e a MP nº 478possam resultar
em aumento de imposto de renda ou da Contribuição Social sobre o Lucro, no
exercício de 2009.
Sobre os efeitos das MPs nº 472, nº 476e nº 478,
relativamente a fatos geradores ocorridos em 2010.
21. O art. 62, §§3º e 7º, da Constituição Federal estabeleceu
prazo de 60 dias, prorrogáveis por igual período, para que medidas provisórias
sejam convertidas em lei, devendo o Congresso Nacional editar Decreto
Legislativo para disciplinar as relações jurídicas decorrentes de tais medidas:
"Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o
Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei,
devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional.
(...)
§ 3º As medidas provisórias, ressalvado o disposto nos §§ 11
e 12 perderão eficácia, desde a edição, se não forem convertidas em lei no
prazo de sessenta dias, prorrogável, nos termos do § 7º, uma vez por igual
período, devendo o Congresso Nacional disciplinar, por decreto legislativo, as
relações jurídicas delas decorrentes.
(...)
§ 7º Prorrogar-se-á uma única vez por igual período a
vigência de medida provisória que, no prazo de sessenta dias, contado de sua
publicação, não tiver a sua votação encerrada nas duas Casas do Congresso
Nacional.
(...)"
22. Conforme o citado §3º, decorrido o prazo de cento e
vinte dias sem que ocorra a conversão das MPs em Lei, ocorrerá a perda de sua
eficácia. Além disso, o §11 do art. 62, da CF prevê que, caso não editado o
decreto legislativo em até sessenta dias após a rejeição ou perda de eficácia
de medida provisória, as relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos
praticados durante sua vigência continuarão a ser regidas pela mesma MP:
"Art. 62 (...)
§ 11. Não editado o decreto legislativo a que se refere o §
3º até sessenta dias após a rejeição ou perda de eficácia de medida provisória,
as relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos praticados durante sua
vigência conservar-se-ão por ela regidas. "
23. Em 31 de maio de 2010, as MPs nº 476, de 2009, e nº 478,
de 2009, haviam expirado sem que tivessem sido convertidas em lei. Convém
lembrar que, no caso, não foi editado Decreto Legislativo para, segundo o §3º
do art. 62, da CF, disciplinar relações jurídicas constituídas e decorrentes de
tais MPs.
24. Em 24 de maio de 2010, o Projeto de Lei de Conversão da MP
nº 472, de 2009, foi encaminhado para sanção ou veto do Presidente da
República, sem previsão de revogação do art. 2º da Lei nº 9.959, de 2000,
conforme dispunha o art. 61, inciso II, da MP nº 472, de 2009. A Lei nº 12.249,
de 11 de junho de 2010, foi sancionada sem o texto do art. 61, II, da MP nº
472, de 2009.
25. Como decorrência, formulou-se o entendimento de que, com
base no art. 62, § 12, da Constituição Federal, a MP nº 472, de 2009, voltaria
a viger e, dessa forma, o Método PRL não poderia ser aplicado a fatos geradores
ocorridos entre 1º de junho e 10 de junho de 2010:
"Art. 62 (...)
§ 12. Aprovado projeto de lei de conversão alterando o texto
original da medida provisória, esta manter-se-á integralmente em vigor até que
seja sancionado ou vetado o projeto."
26. Mais uma vez, recorre-se, aoart. 62, § 2º, da
Constituição Federal, para observar que tal entendimento não é cabível.
Medida provisória que implique instituição ou majoração de
impostos somente produz efeitos no exercício financeiro seguinte se tiver sido
convertida em lei até o último dia daquele em que foi editada. Para se admitir
a nova vigência da MP nº 472, de 2009, com efeitos sobre o período citado, sua
conversão em lei deveria ter ocorrido em 2009.
27. Convém lembrar que o reconhecimento da eficácia da MP nº
472, de 2009, no período entre 1º de junho e 10 de junho de 2010, significaria
a exclusão da possibilidade de escolha do método PRL por parte do contribuinte
- e, por decorrência, implicaria potencial majoração de imposto - sem que tal
medida tivesse sido convertida em lei no exercício anterior.
28. É importante destacar que com a edição da MP nº 476 e MP
nº 478, ficou evidente o objetivo do Poder Executivo de não manter a revogação
do art. 2º da Lei nº 9.959, de 2000. A própria Exposição de Motivos da MP nº
476 já havia identificado que "... a revogação acarreta a inaplicabilidade
do método denominado Preço de Revenda menos Lucro (PRL) uma vez que fica sem
margem de lucro a ser considerada na apuração do preço parâmetro".
29. Nesse sentido, sublinha-se que, ao retirar o art. 61,
inciso II, do Projeto de Lei de Conversão nº 1, de 2010, durante a apreciação
da MP nº 472, de 2009, o Congresso Nacional demonstrou ter alinhado seu
entendimento com aquele manifestado pelo Poder Executivo.
30. Nesse caso, é oportuno mencionar que, segundo decisão do
Supremo Tribunal Federal (STF), no RE 217.194 (Rel. Min. Maurício Corrêa,
julgamento em 17-4-2001, Segunda Turma, DJ de 1º-6-2001), a remessa para sanção
ou veto de projeto de lei de conversão para o Presidente da República só é
obrigatória quando há modificação de dispositivos a fim de prevalecer comunhão
de vontade do Poder Executivo e do Legislativo.
31. Como, na hipótese em questão, não houve modificação que
demonstrasse inconsistências entre a vontade do Poder Executivo e o
entendimento do Poder Legislativo quanto à utilização do método PRL, não cabe admitir
a eficácia da MP nº 472, de 2009, entre os dias 1º e 10 de junho de 2010.
32. A lógica do §12 do art. 62 da Constituição Federal é
evitar que alterações procedidas pelo Congresso Nacional na conversão em lei de
medidas provisórias possam produzir efeitos antes da apreciação do Poder
Executivo, levando a efeitos não desejados quando da edição da MP.
33. No caso em tela, não cabe a aplicação do §12 do art. 62
da CF tendo em vista que o Congresso Nacional manteve a intenção do Poder
Executivo, refletida na MP nº 476, de 2009 e na MP nº 478, de 2009, não
reconhecendo efeitos à revogação do art. 2º da Lei nº 9.959, de 2000. Como o
Projeto de Lei de Conversão nº 1, de 2010, foi encaminhado para sanção sem o
texto do art. 61, inciso II, entende-se que deve prevalecer o consenso entre o
Poder Executivo e o Poder Legislativo sobre a questão.
34. Além disso, não seria coerente dar eficácia por dez dias
a um dispositivo que foi rejeitado pelo Congresso Nacional - por ocasião da
conversão da MP em PL - e pelo Poder Executivo.
Efeitos relativos aos fatos geradores ocorridos entre 1º de
janeiro de 2010 e 31 de maio de 2010.
35. É importante lembrar que, por força do art. 6º da MP nº
476, de 2009, o art. 2º da Lei nº 9.959, de 2000, voltou a viger, tornando-se
possível a aplicação do método PRL no período em questão. As Medidas
Provisórias nº 476 e nº 478 regeram as relações jurídicas constituídas,
conforme já visto, tendo em vista o transcurso do prazo Constitucional de 120
dias para sua apreciação.
36. Sob tal perspectiva, identificam-se hipóteses em que a
aplicação da MP nº 478 pode apresentar situações desfavoráveis ao contribuinte:
nos casos de simples revenda, por exemplo, a criação do novo método de cálculo
PVL, com margem de lucro de 35%, ao ser comparado com o Método PRL, com margem
de 20%, pode representar aumento de carga tributária. Nesse caso, no que diz
respeito ao imposto de renda, a análise dos efeitos da MP nº 478, de 2009,
deverá ter por base o art. 62, § 2º, da Constituição Federal. Dado que a
aplicação do Método PVL, com margem de 35%, no caso específico da revenda, pode
representar majoração de imposto, a MP nº 478, de 2009, não poderá gerar
efeitos no exercício de 2010. O mesmo entendimento se aplica às hipóteses em
que o Método PVL 35 for desfavorável ao contribuinte, em comparação aos Métodos
PIC ou CPL.
37. Por outro lado, nas hipóteses em que o contribuinte
optar pelo método PRL com margem de sessenta por cento, a MP nº 478, de 2009, é
considerada eficaz para reger, fatos geradores ocorridos entre 1º de janeiro e
31 de maio de 2010.
38. Quanto à Contribuição Social sobre o Lucro Líquido
(CSLL), a análise deve ter por base o art. 195, §6º, da Constituição Federal,
que prevê:
"Artigo. 195. (...)
§ 6º As contribuições sociais de que trata este artigo só
poderão ser exigidas após decorridos noventa dias da data da publicação da lei
que as houver instituído ou modificado, não se lhes aplicando o disposto no
art. 150, III, "b"."
39. Dessa forma, no que diz respeito à CSLL, há que se
observar o prazo de noventa dias desde a edição da MP nº 478, de 2009, para que
esta seja considerada eficaz.
Efeitos relativos aos fatos geradores ocorridos a partir de
1º de junho de 2010.
40. A análise do período posterior a 1º de junho de 2010 tem
por base o fato de que, com o art. 6º da MP nº 476, de 2009, o art. 2º da Lei
nº 9.959, de 2000, voltou a viger, de forma a viabilizar o uso do método PRL, e
que as Medidas Provisórias nº 472, nº
476 e nº 478 haviam expirado sem que tivessem sido convertidas em lei.
Conclusões
41. Diante do exposto conclui-se que:
41.1. o método PRL com margem de lucro de 20% e com margem
de lucro de 60% previsto na alínea "d" do inciso II do art. 18 da Lei
nº 9.430, de 1996, pode ser aplicado nos anos-calendário de 2009 e 2010;
41.2. para o período de 1º de janeiro de 2010 a 31 de maio
de 2010, pode ser aplicado o método PVL com margem de lucro de 35%, previsto na
MP nº 478, de 2009, na hipótese em que seja mais favorável ao contribuinte.
À consideração superior.
FLÁVIO TEIXEIRA BARBOSA
Auditor Fiscal da Receita Federal do Brasil
Aprovo.
Encaminhe-se ao Subsecretário de Tributação e Contencioso
(Sutri), com proposta de encaminhamento ao Secretário da Receita Federal do
Brasil, para aprovação.
CLÁUDIA LÚCIA PIMENTEL MARTINS DA SILVA
Coordenadora-Geral de Tributação
Substituta
De acordo.
Encaminhe-se ao Secretário da Receita Federal do Brasil para
aprovação.
SANDRO DE VARGAS SERPA
Subsecretário de Tributação e Contencioso
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